por André Vasques e Guilherme Moraes, sócios da Moraes Vasques Advogados Associados
Nos últimos anos, o Brasil assistiu à explosão das plataformas de apostas, impulsionadas por propagandas com influenciadores, clubes de futebol e até celebridades. O que começou como uma promessa de entretenimento digital e nova fonte de arrecadação tributária, rapidamente se transformou em um terreno fértil para a atuação silenciosa — e sofisticada — do crime organizado.
A pergunta que se impõe é: as bets estão se tornando os novos cassinos da lavagem de dinheiro no país?
A regulamentação desse setor ainda caminha com insegurança, apesar de avanços legislativos recentes, muitas casas de aposta ainda operam no Brasil sem sede nacional, sem rígido controle financeiro e com fluxos opacos de entrada e saída de valores. Nesse cenário, as plataformas se tornaram atrativas para movimentações suspeitas que escapam do radar das autoridades.
O modo de operação costuma seguir um padrão: o criminoso realiza depósitos “disfarçados” como apostas, ganha e saca valores como se fossem legítimos e, assim, “lava” recursos de origem ilícita. O processo é rápido, virtual e sem fronteiras.
Além disso, investigações têm revelado o uso das bets para manipulação de resultados, especialmente em campeonatos esportivos de divisões inferiores ou de menor visibilidade. Jogadores, dirigentes e apostadores se tornam peças-chaves de uma engrenagem controlada por organizações que não apenas movimentam dinheiro, mas estruturam redes de corrupção sistêmica, com impacto direto no esporte e na economia informal.
A Operação Penalidade Máxima, conduzida pelo Ministério Público de Goiás, a exemplo, revelou o quanto essas estruturas são planejadas e potencialmente transnacionais. Há indícios de que o dinheiro apostado no Brasil segue para contas em paraísos fiscais, triangulado por empresas de fachada e, muitas vezes, retorna em forma de contratos, patrocínios ou ativos digitais — dificultando qualquer tentativa de rastreamento patrimonial.
O desafio jurídico agora é duplo: de um lado, o sistema financeiro e penal precisa ser robusto para identificar e responsabilizar penalmente os operadores e intermediários da lavagem; de outro, é essencial garantir a segurança jurídica daqueles que usam as plataformas de forma lícita e transparente, com o fiel compromisso de diversão.
Entre omissão e excesso, o Direito Penal não pode correr o risco de criminalizar a atividade legítima nem permitir que ela sirva de escudo para esquemas multimilionários. É chegada a hora de um debate sério sobre o tema. A legalização das apostas não pode significar a legalização da impunidade. Sem fiscalização efetiva, as bets se tornam um cassino digital não só para os jogadores, mas para o crime organizado — que, mais uma vez, encontra alternativas para se disfarçar de empreendedorismo digital.
No dia 10 de junho, a Senadora Soraya Thronicke, do Podemos-MS, incluiu em seu Relatório Final, o pedido de indiciamento de 16 pessoas pelos delitos de estelionato, lavagem de dinheiro, crimes contra o consumidor e eventuais contravenções de jogos de azar.
Destacam-se a influenciadora digital Virgínia Fonseca, Deolane Bezerra, dentre outros empresários, influenciadores e pessoas apontadas como “laranjas”. Respeitando o rito processual, o Relatório Final ainda será submetido à votação no Senado, antes de ser oficialmente enviado ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal.
Além dos indiciamentos, o texto propõe 18 projetos de lei e 21 medidas regulatórias, com o propósito de, assim, (tentar) garantir uma segurança àqueles que utilizam a plataforma de forma lícita.