Há pouco tempo, trabalhadores da Embraer em São José dos Campos (São Paulo) fizeram paralisação de uma hora, reivindicando reajuste salarial de acordo com a inflação e pedindo fim das terceirizações na produção de aeronaves. A empresa propôs reajuste muito aquém do exigido pelos operários, e então a paralisação provavelmente prenuncia uma greve futura.

Atualmente, produtos básicos de alimentação estão bastante caros. Além disso, fazem muitos anos que não há um aumento salarial coerente com a alta inflação. Todos sofrem com esta situação, alguns menos e outros mais. Também em São Paulo, motoristas de ônibus avisaram que haveria greve, por novas negociações sobre a Participação nos Lucros e Resultados. Já que reajuste salarial é tão difícil, quem sabe a vida melhore um pouco por meio da PLR. Mas o Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região de São Paulo concedeu liminar limitando por demais qualquer paralisação que seja tentada.

Penalizações do trabalho

A realidade vivida pelos trabalhadores no Estado de São Paulo e em outros lugares,traz atualidade para o livro “A farsa do neoliberalismo”, do brilhante historiador Nelson Werneck Sodré. Há uma fobia de trabalhador, há uma guerra contra o Estado, tudo deve ser dado para o mercado e nada deve ser dado a quem fornece a força de trabalho.  É o castigo ao trabalho, quando todas as culpas são dos trabalhadores. Uma das formas de fazer este castigo é desestimular que os trabalhadores tenham vida digna, e eu cito um exemplo: recentemente foi noticiado que o ministro Paulo Guedes trabalha para desvincular o salário mínimo da inflação. Na prática, o salário já está desvinculado do custo de vida e dos preços dos alimentos, em uma tendência aprofundada pela pandemia do Covid-19 e anterior a ela. Em outras palavras: a culpa dos problemas brasileiros é das pessoas que recebem salário mínimo e este salário deve ser o mais miserável possível.

No texto intitulado “Penalização do trabalho” (quando o autor fala em trabalho, se refere aos trabalhadores), Sodré faz uma ironia: “Numa discussão a propósito das grandes invenções e descobertas, que propiciam o desenvolvimento humano, teses variadas surgiram. Para uns a grande descoberta fora o fogo; para outros, a roda etc. A tese mais discutida, acirradamente, porque toca uma área sensível a que ninguém pode ficar indiferente, propõe que a descoberta fundamental na história foi a de que é possível e é até positivo que o fardo do trabalho possa ser colocado sobre outrem. Positivo para os que se aproveitam disso, naturalmente.” Se Nelson Werneck vivesse no Brasil agora, ficaria estarrecido ao ver que muitos dos explorados defendem os exploradores, que muitos brasileiros hoje defendem a humilhação da maior parte da população de nosso país e a venda a “preço de banana” de empresas estatais.

Greve contra a privatização em Belo Horizonte

É muito comum que as empresas, ao serem notificadas pelos sindicatos sobre uma futura greve, peçam para a justiça que proíba a paralisação. E muitas vezes, esta postura, inibe e acaba com toda mobilização. No entanto foi distinto em Belo Horizonte, onde o sindicato dos metroviários organizou protesto distribuindo bananas e fez uma paralisação em dois dias, mesmo depois da justiça proibir a greve anunciada pela entidade. Os metroviários responderam desta forma, depois da divulgação de um edital de concessão da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e seus 35 metrôs por preço menor que o valor de uma unidade destes transportes coletivos, para a iniciativa privada, que participará de leilão marcado para dezembro. A greve foi total, contra a privatização dos trens urbanos mineiros, com vendas a “preço de banana”.

Privatização e desemprego

A privatização, no Brasil, resulta em milhares de desempregados. O governo federal campeão em venda de empresas estatais, Fernando Henrique Cardoso, foi o campeão nos índices de desemprego no Brasil. Os metroviários de BH temem perder seus empregos, e se organizam para responder a essa possibilidade, como podem. Fico na torcida para que eles sigam empregados e sejam vitoriosos.

No Rio Grande do Sul, o tema da privatização é usual. Inclusive, um dos candidatos para o segundo turno para o governo do Estado fez a promessa, de que não irá privatizar o Banrisul. Ora, ele havia dito que não venderia a Corsan, e mudou de ideia. Esta é a trajetória do Eduardo Leite. Como a venda de empresas estatais é algo muito presente na política brasileira, atingindo o cotidiano de todos nós, este assunto não poderia ficar de fora também do ENEM.

Questão do ENEM mencionando a privatização, em 2016

O mercado tende a gerir e regulamentar todas as atividades humanas. Até há pouco, certos campos — cultura, esporte, religião — ficavam fora do seu alcance. Agora, são absorvidos pela esfera do mercado. Os governos confiam cada vez mais nele (abandono dos setores de Estado, privatizações).
RAMONET, I. Guerras do século XXI: novos temores e novas ameaças.
Petrópolis: Vozes, 2003.
No texto é apresentada uma lógica que constitui uma característica central do seguinte sistema socioeconômico:
A Socialismo.
B Feudalismo.
C Capitalismo.
D Anarquismo.
E Comunitarismo.

O jornalista Ignácio Ramonet tem ideias muito válidas para reflexões sobre a geopolítica e a globalização. Para o autor, a globalização é um fenômeno de pilhagem planetária, de mercantilização crescente de tudo nas nossas vidas, uma era de profundas desigualdades. Globalizar também é privatizar, e aqui no Brasil, principalmente. Afinal, todos os presidentes, desde 1990 ajudaram o mercado a absorver mais e mais setores do Estado, a cada dia temos novos campos regulados pelo mercado: afinal até o tempo é dinheiro e o que vier é lucro, dizem.

Em outras palavras: totalitarismo da economia

A hegemonia do mercado nas relações em sociedade, é algo peculiar do capitalismo, e estranho para o socialismo, feudalismo, anarquismo e comunitarismo. Em resumo: a privatização dos metrôs em Belo Horizonte é uma lasquinha de algo enorme, que está bem explicado na obra “A farsa do neo liberalismo”. No neoliberalismo não há harmonia entre os poderes da política e da economia: aqui a economia é absoluta e totalitária.

Foto: Jornalista, escritor e especialista em comunicação francês, Ignacio Ramonet. Quem um dia afirmou que “a historia nos ensina que quando desaparece a verdade, também desaparece a liberdade.”