No dia 21 de março de 2014 participei de uma atividade promovida pela Ordem dos Advogados do Brasil em parceria com a Comissão Estadual da Verdade, em Porto Alegre, para resgatar elementos históricos ocorridos na ditadura militar. Na ocasião foi apresentado o documentário “O Dia que durou 21 anos”, e fizemos um debate com o jornalista Flávio Tavares. Resgato esse fato nesse momento histórico para poder compartilhar com os demais leitores do jornal O Alvoradense informações importantes sobre o que está ocorrendo no Brasil. Também compreendo como oportuno o texto em virtude da postura editorial do veículo que ampliou sua cobertura jornalística para temas regionais e nacionais.
Para tanto, se faz necessário que trate de alguns temas que podem soar alguma natureza pessoal, porém sempre com o objetivo de favorecer a compreensão do leitor sobre o ponto de vista que se debruça o texto. Naquela sexta-feira, 21 de março, de 2014, na sede da OAB de Porto Alegre foi um grande momento que evidenciava desde então os acontecimentos em curso no Brasil de hoje e a necessidade de preservarmos nossos interesses nacionais, tal como o petróleo que parece ter entrado na ordem do dia no mercado internacional.
Por anos não falei em público sobre as experiências que vivi na década de 90, sendo a primeira metade como sargento do Exército e a segunda como ativista de direitos humanos. A importância histórica que teve o Comandante Maurer, ao defender um reposicionamento das Forças Armadas que pudesse encontrar uma sintonia com a sociedade democrática. As resistências a essa ideia que sempre compartilhei marcaram minha vida militar na caserna.
A segunda metade daquela década me tornei comunicador, diretor de empresa de comunicação, político e militante dos direitos humanos. Nesse período, a professora Clotilde Cechin e o jornalista, ativista e amigo Marcos Rolim foram fundamentais para minha formação. Estaria ao lado deles sempre, mas os caminhos da vida nos impuseram percursos diferentes que me possibilitaram andar com as próprias pernas.
Naquela sexta-feira (21), após uma longa e exaustiva jornada de trabalho, saí de Alvorada para acompanhar o final da atividade promovida pela OAB em parceria com a Comissão Estadual da Verdade. Lá encontrei o jornalista Flávio Tavares que apresentou o documentário “O dia que durou 21 anos”. Estava estudando sobre o assunto, pois preparava um produto editorial sobre o tema.
O documentário de Camilo Tavares, filho de Flávio, trouxe à tona as malditas memórias. Nos depoimentos apresentados no filme surgiam lacunas de compreensão. Vazios que mereciam ser preenchidos. Era visível que parte do processo necessitava de um complemento para que a nossa história pudesse ser compreendida. Uma das peças desse imenso quebra cabeças estava na ponta da minha língua. Então decidi me pronunciar e o plenário pegou fogo, com uma enxurrada de posições acerca do que havia sido exposto. Ou seja, acabei revelando que a estrutura que havia dado o golpe no Brasil em 64 estava viva e presente, porém adormecida nas entrelinhas do treinamento militar que recebi. Nas cartilhas dos currículos das melhores escolas privadas e algumas públicas. Que as famílias tradicionais que deram os primeiros golpes de estado no Brasil estavam vivas, ativas e cheias de privilégios, principalmente no Rio de Janeiro, como bem aponta Luis Eduardo Soares em sua obra “Meu Casaco de General – 500 dias no front da segurança pública do Rio de Janeiro” (Cia das Letras).
Flávio é a pessoa mais generosa que encontrei em muito tempo. Sua lucidez inspiradora me deu forças e até me senti orgulhoso de estar exausto por motivos que todos no entorno me julgariam como um idiota. E fazem isso frequentemente. Por um momento, Flávio espantou a solidão e o isolamento, sensação que tenho tido com frequência nas atividades militantes. Ele soprou uma luz ao demonstrar que a mediocridade não tomou conta de todos. Ainda existe inteligência e quero poder compartilhar o quanto possível. Agradeci muito aos organizadores em proporcionar aquele momento, em plena turbulência social vivida em 2014, que encontramos a fatura de não ter promovido a “verdade ao povo brasileiro” e permitindo que reascendam a ideia do retorno de um regime semelhante no Brasil. Quero poder compartilhar com os alvoradenses esse belo trabalho.
O documentário segue abaixo:
*: Jornalista