O fogo e seu simbologismo

Quando o homem primitivo descobriu o fogo, certamente deu o mais importante passo em sua história. Através dos tempos nós aprendemos a usar sua energia para inúmeros propósitos: usamos o fogo para trazer luz à escuridão, para cozinhar nossos alimentos, para aquecer nossas habitações e no passado para movimentar locomotivas. Reconhecido pelos antigos como um dos quatro elementos do mundo.

O fogo é um princípio ativo, transmutador e transformador. As suas principais características vão desde a materialidade até a espiritualidade, que coloca o buscador ou o devoto mais próximo do Criador. No Livro Sagrado, o fogo é sinal de presença e ação do Criador é expressão da Santidade e da transcendência Divina, por esse motivo, uma chama é símbolo da letra Hebraica IOD que além de outros significados representa o Criador.

Os gregos e os romanos conservavam em seus altares uma chama de fogo. Quando partiam para a luta sempre levavam uma tocha do “Fogo Sagrado” dos templos do qual esperavam proteção e vitória. As casas gregas e romanas que se situavam longe dos templos onde o fogo era venerado, recebiam uma chama distribuída por atletas especialmente designado para essa atividade.

Chama Crioula

Para compreendermos a origem e o significado da chama crioula, precisamos voltar no tempo e identificar a trajetória e função pedagógica a respeito do fogo simbólico. A formação do imaginário nacional visando a construção da identidade da cultura nossa regional, materializada através do fogo simbólico até a chama crioula.

Quando falamos em símbolos no Brasil, muito se deve à maçonaria e à Liga de Defesa Nacional. A origem da chama crioula está ligada diretamente à Liga de Defesa Nacional. Podemos afirmar que se não fosse a Liga de Defesa Nacional, não teríamos a chama crioula e nem o fogo simbólico.

Liga de Defesa Nacional

Associação civil fundada em 7 de setembro de 1916 no Rio de Janeiro por Olavo Bilac, Pedro Lessa e Álvaro Alberto, entre outros. Seu objetivo central, de acordo com os estatutos de 1916,era “congregar os sentimentos patrióticos dos brasileiros de todas as classes”, difundindo “a educação cívica, o amor à justiça e o culto ao patriotismo”. Foi considerada de utilidade pública pelo Decreto nº 67.576, de 16 de novembro de 1970 e em 1995 teve sua diretoria transferida do Rio de Janeiro para Brasília. Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, Olavo Bilac. Nascido no Rio de Janeiro em 16 de dezembro de 1865. Poeta, escritor e jornalista, autor do hino à bandeira e um dos criadores da Academia Brasileira de Letras.

A LDN foi fundada na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, e incorporou o nome da mais importante publicação militar da época, A Defesa Nacional (lançada em 1913).

Fogo Simbólico no Brasil

Da Alemanha para o RS, Viamão, e para o resto do País

A ideia do fogo simbólico para o Brasil de forma concreta, veio da Alemanha em 1936, por ocasião dos jogos olímpicos de Berlim, que inspirados nos gregos, que usaram a força do simbolismo da tocha olímpica, para uma maneira de unificar o povo alemão de desenvolver o forte sentimento nacionalista. Esta idéia também foi usada por Getúlio Vargas mais tarde para legitimar a cultura nacional.

Ele foi idealizado, em 1937, por um grupo de gaúchos que procurava um símbolo do ardor cívico do nosso povo. O FOGO SIMBÓLICO representa o elemento que impulsionou a evolução da humanidade.

Surge a corrida do Fogo Simbólico

No Rio Grande do Sul, a corrida do fogo simbólico foi resultado da apropriação e representação de elementos históricos e culturais adquiridos durante os jogos de Berlim, pois lá estavam os gaúchos Túlio de Rose, Ernesto Capelli, João Carlos Daudt e Humberto Sachs, observando a cerimônia e a participação do povo em torno do fogo simbólico, Túlio de Rose ficou impressionado com a força que a tocha proporcionava à população.

Dizia Túlio: “Era como se ela pudesse abençoar e proteger aquele povo, que demonstrava uma grande paixão pelo seu país” (Revista Globo, 1939, p. 66). Ao retornar, decidiu organizar uma corrida com a tocha cívica, com o apoio da Liga de Defesa Nacional. A primeira Corrida do Fogo Simbólico no Brasil foi realizada em 1938, por Túlio de Rose. Teve como ponto de partida a Igreja Matriz de Viamão, com a chegada da pira da pátria no Parque Farroupilha, em Porto Alegre. No segundo ano de sua realização, a corrida partiu da igreja no centro da cidade de Rio Pardo, chegando a Porto Alegre. Desde então, todos os anos, nas comemorações da nossa independência, a LIGA DA DEFESA NACIONAL realiza a cerimônia do FOGO SIMBÓLICO, como ato de abertura da semana da Pátria.

Nasce a Chama Crioula

Imbuído do mesmo espírito de amor à querência e buscando manter o culto ao sentimento de amor à tradição gaúcha, inspirado neste cívico sentimento patriótico e objetivando o fortalecimento do tradicionalismo e união de todos que cultuam a história de nosso povo, através da energia emanada deste fogo, Paixão Côrtes foi buscar na fonte desta energia a chama que passou a denominar CHAMA CRIOULA.

Tendo Paixão Côrtes criado em agosto o departamento de tradições gaúchas, junto ao grêmio estudantil do Colégio Julio de Castilhos, no dia 4 de setembro de 1947 visitou a Liga de defesa Nacional em Porto Alegre, para solicitar que fosse autorizada a retirada de uma centelha da pira da pátria, onde ardia o fogo simbólico da Semana da Pátria, para realizar uma ronda ao fogo, aproveitando o mesmo simbolismo e espírito cívico das comemorações da independência do Brasil, porém voltados ao regionalismo gaúcho em decorrência das comemorações do 20 de setembro, data do início da revolução farroupilha.

Ao ser autorizado para tal ato pelo Chefe da LDN Maj Vignolli, Paixâo Côrtes recebe a incumbência de formar um grupo de cavalarianos (piquete) para receber os restos mortais de David Canabarro (herói farroupilha) e conduzir do aeroporto até o panteão dos heróis do estado no cemitério da Santa Casa. Ao convocar seus colegas estudantes, Paixão cria o chamado “Grupo dos Oito”, que executam o referido cortejo no dia 5 de setembro (comemorado hoje em dia como DIA DO JOVEM TRADICIONALISTA).

No dia 7 de setembro, três cavalarianos: Paixão Côrtes, Cyro Dutra Ferreira e Fernando Vieira, às 24 horas ao ser extinto o fogo simbólico, é retirada da pira da pátria uma centelha, com um archote improvisado.

No departamento de tradições gaúchas é criada a ronda crioula. Paixão Côrtes com o archote acende o candeeiro ( antigo lampião abastecido com querosene). A ronda crioula que constava de uma roda de mate onde aconteciam declamações e contações de causos se estendeu até o dia 20 de setembro. No baile no Teresópolis Tênis Clube onde aconteceu o primeiro fandango gaúcho a chama foi extinta.

Nos anos seguintes o ato se repetiu mas nos locais onde estava sediado o 35, que inicialmente não teve endereço definitivo. Posteriormente a chama crioula, anualmente é gerada de uma determinada cidade, distribuída e conduzida por piquetes de cavalarianos aos “quatro cantos do estado”, dando início às comemorações dos festejos farroupilhas.

O acendimento e geração para distribuição para todo o estado do RS hoje em dia acontece no mês de agosto. Centenas de cavaleiros buscam no local de origem pré determinado pelo MTG, e levam à “pata-de-cavalo” para as suas regiões tradicionalistas.

Alguns Locais Históricos de Acendimento

Em 1957 em São Gabriel no local onde aconteceu a Batalha de Caiboaté

1958 onde nasceu o Gen Osório

1959 na cidade de Guaíba (na casa de Gomes Jardim)

1960 em Viamão e em 2005 também, em homenagem à trincheira histórica de cerco dos farroupilhas à cidade de Porto Alegre, durante a Revolução Farroupilha

1981 na estância do Cristal na época Camaquã

1984 em Caçapava do Sul, segunda capital farroupilha

1985 ano do sesquicentenário da Revolução Farroupilha, uma cavalgada levou a chama crioula pelos 14 municípios que haviam na época da revolução.

1986 no acampamento do Seival, local da proclamação da república Riograndense (11 set 1836)

1994 – Em São Sepé, na estância do Boqueirão, onde um fogo-de-chão está aceso há mais de 200 anos

1996 em Candiota, campo dos Menezes

2000 em Alegrete na Capela Queimada.

Também foi recolhida da Fazenda Boqueirão, no interior de São Sepé/ RS, onde o fogo de chão está aceso desde o início do ano de 1800.

Em Viamão acontece o recebimento de três centelhas, uma vinda do Forte Santa Teresa no Uruguai, e dá origem a Chama Itinerante de Viamão.

A partir de 2001 o acendimento passa a ser um evento estadual, cujos locais de geração são votados em congresso.

2001 em Guaíba no cipreste em frente à casa de Gomes Jardim

2002 em Laguna, com distribuição em Santa Maria, junto à estátua de João Cezimbra Jacques

2003 em Camaquã, no sitio de Barbosa Lessa

2004 em Erechim

2005 em Viamão, cidade onde aconteceu o cerco à Porto Alegre na revolução farroupilha

2006 em São Gabriel na sanga da bica, onde tombou Sepé Tiarayu

2007 em São Nicolau, 1ª redução Jesuítica (1ª querência do Rio Grande)

2008 em São Leopoldo

2009 em São Lourenço, na estância do sobrado, residência de Ana irmã de Bento Gonçalves.

(A história da Chama continuará na próxima edição, em 10 de setembro)

Todos os créditos do texto e pesquisa são de Cesar Tomazzini Liscano

Fontes:

1. Ivone Costa – 15 anos de UTV, no Lombo da Cultura gaúcha, 2004

2. Celso Broda – Chama Crioula Itinerante de Viamão (http://www.portalviamao.com.br)

3. Almanaque dos Gaúchos 3, pg 51

4. Criação do 35 CTG, Cyro Dutra Ferreira

5. Primórdios do MTG, Paixão Côrtes

6. Cerimonial e Protocolo na organização dos eventos tradicionalistas, Cesar Tomazzini

Pesquisa: Cesar Tomazzini