Os pais sabem. Não há pior sensação do que ver um filho doente. Nessas circunstâncias também eles se sentem frágeis, incapacitados, violados. Quando é necessária internação, a situação se agrava ainda mais. O ambiente de um hospital duplica a sensação de hostilidade e impotência. Contudo um casal alvoradense teve essa sensação amplificada. Necessitando de maiores cuidados, seu filho ficou por vários dias internado em Alvorada a espera de um leito em uma UTI.
Kaio tem 8 anos e é filho do motorista Marco Antônio Marques e Angelita Silva de Souza. Ele sofre da síndrome de West, doença rara que causa paralisia física e mental, e deu entrada com crise respiratória na emergência no dia 19 de junho. O quadro se complicou e houve a necessidade de transferência para uma Unidade de Tratamento Intensivo. Como nada aconteceu por dias, a família entrou com um recurso na Justiça e obteve uma liminar em 1º de julho. A situação, contudo, seguiu a mesma até semana passada.
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Angelita diz que as condições da emergência do Hospital de Alvorada são ruins, com as enfermeiras sem tempo de realizar a higiene dos pacientes. Ela mesma é quem cuidava disso. A mãe deixou o trabalho para ficar com o menino.
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Desesperado, o pai chegou a se acorrentar na grade em frente ao Hospital, pedindo um leito para o filho. Ele contou com o apoio da comunidade, que também esteve em frente à instituição reivindicando uma ação.
Por coincidência ou não, naquele mesmo dia surgiu um leito no Hospital da Ulbra em Canoas, através da Central de Leitos do Estado. Neste período, o quadro do menino se agravou e ele voltou a ter convulsões. Ao sair de Alvorada apresentava pneumonia contagiosa e adquiriu uma bactéria hospitalar. “A saúde está morrendo junto com o meu filho”, resumiu Angelita.
O triste episódio com Kaio expôs a crise na saúde pública, que atinge o país e a quase totalidade dos municípios gaúchos.
Corte de repasses
Roberto Benevett, diretor-geral do Hospital de Alvorada, confirma que a situação é crítica e atribui aos cortes de repasses, Estadual e Federal, ocorridos nos últimos dois meses. Essa redução varia de R$ 230 mil a R$270 mil mensal. Desde que os cortes começaram, reuniões permanentes ocorrem entre a diretoria da unidade hospitalar. “Devemos pedir apoio para a Prefeitura de Alvorada e ao governo do Estado nos próximos dias”, informa. Caso não haja alguma medida, ele avalia que serviços sofrerão restrições.
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No início da semana o Conselho das Secretarias Municipais de Saúde ingressou com uma ação na Justiça contra o Governo do Estado para garantir que as verbas da saúde sejam encaminhadas em dia. Contudo, de acordo com a Secretaria Estadual da Saúde, este foi o primeiro mês em que o Governo não teve condições de pagar em dia os recursos destinados a hospitais.
A situação é crítica. Em Guaíba, o Hospital Nossa Senhora do Livramento fechou nesta segunda, dia 6, porque o convênio não foi renovado, somando um déficit é de R$ 324 mil em 2015.
No município de Canoas o acúmulo é de R$ 17 milhões de atraso nos repasses do Estado desde 2014. Ali são realizados mais de 70 mil procedimentos e o município entrou com ação para tentar regularizar os repasses.
O Hospital Ana Nery, de Santa Cruz do Sul, o setor de oncologia, onde são feitas quase mil quimioterapias por mês pelo SUS, acumula dívida de aproximadamente R$ 2 milhões.
No início do mês o Hospital de Caridade de Canguçu foi fechado por falta de repasse do Estado: R$ 4,5 milhões. E a população de Três de Maio protestou para evitar o fechamento do serviço de urgência e emergência do Hospital São Vicente de Paulo, que acumula quase R$ 3 milhões em dívidas do Estado desde 2013.
Fonte: O Alvoradense