O céu cinza e pesado da última terça-feira parecia imaginar com olhos tristes o que seria das vidas das 90 famílias que tiveram que deixar o pouco que tinham no Loteamento Morumby.
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A operação grandiosa envolvendo aproximadamente 250 agentes da Brigada Militar vai ficar na lembrança de todos aqueles que assistiram à ação. A ordem de despejo foi expedida pela juíza de direito Nara Cristina Neumann Cano Saraiva, titular da 1ª Vara Cível de Alvorada, cumprindo uma liminar datada de 13 de setembro de 2011. De acordo com informação passada pela Polícia Militar, cerca de 300 pessoas foram retiradas da área.
Os moradores, em sua maioria pessoas de baixa renda, deixaram o local de forma pacífica. Apesar de todos demonstrarem descontentamento com o poder público, que não apresentou nenhuma alternativa de mudança e apenas exigiu a saída das famílias do terreno, não houve nenhum tipo de protesto.
Desolada e com seis filhos, Fabiana de Melo só se perguntava se ainda existem amor e caridade no mundo. Ela havia se mudado para o local há pouco mais de um mês e foi uma das primeiras moradoras a receber a ordem de despejo. Sem ter para onde ir, ela está com quatro dos seis filhos de forma improvisada na casa da mãe. Os outros dois estão com o pai, em uma casa cuja compra eles conseguiram negociar de última hora.
A questão é que, apenas com o trabalho de pedreiro do marido, ela teme que eles não consigam cumprir a parcela dos R$ 500 mensais que o dono quer pela residência na Stela Maris. Assim como ela, outros tantos moradores do local conseguiram alugar casas que não sabem se terão condições de pagar. Outros, gozando de menos sorte, ficaram sem ter para onde ir.
Sara Martins, que morava no loteamento há um ano, conseguiu alojar a filha de 14 anos e a mãe de 70 em casas de parentes, mas ela e o marido não têm destino. Ela já havia adquirido a pequena casa no loteamento por não querer mais morar de favor, e havia depositado ali as esperanças de um futuro mais tranquilo para sua família.
Sem destino
Desesperada, Juliana Vieira dos Santos não sabia o que fazer na terça-feira quando a ordem de despejo foi entregue em sua casa. Com o avô, cadeirante, três crianças pequenas e a mãe, ela esperava enquanto vizinhos e amigos auxiliavam na mudança. Sem ter para onde ir, o marido saiu sem rumo em busca de uma solução que pudesse aparecer milagrosamente. “Eu não sei o que fazer. Só por Deus mesmo, só por Deus”, afirmava, desolada.
Esse é o caso também de Tiago Solari. Aos 28 anos, o auxiliar de serviços gerais que agora está desempregado viu-se em uma das situações mais difíceis de sua vida. Com esposa e quatro filhos pequenos, era visível em seus olhos e nos de sua esposa o desespero de perder a casa de madeira que acabaram de adquirir. Ele, que viveu durante sete meses em um casebre improvisado sobre o terreno, havia conseguido construir a casa há pouco mais de quatro meses, e agora com o despejo e sem ter como reconstruir a casa no terreno da sogra, que também é pequeno, ele estava sem rumo.
Histórias como essas compadeceram inclusive o tenente-coronel Florivaldo Pereira Damasceno. Chefe do Comando de Policiamento Metropolitano, ele confessou que lhe dói o coração fazer esse tipo de trabalho. Mesmo com mais de 30 anos de Brigada Militar e tendo participado de inúmeras operações como essa, ele afirma que sempre pensa nos netos quando presencia tanta tristeza. Para ele, o poder público deveria prever e evitar determinadas situações. Esta, segundo ele, é uma delas. “Que tipo de violência não será injetada nas mentes dessas crianças pequenas com uma situação dessas?”, questionava. “A casa é um lugar sagrado e um direito de todos”, completou.
Outra dificuldade enfrentada com a desapropriação é a situação das crianças. Parte das famílias que moravam no loteamento tem como única fonte de renda o benefício do Bolsa Família, concedido pelo Governo Federal. Com o despejo, algumas crianças serão obrigadas a deixar de frequentar a escola por dificuldades de deslocamento. É o caso dos 12 netos da senhora Eva Maria Rodrigues. A família de 16 pessoas cuja renda provém somente do benefício teme que, com a mudança para o Bairro São Pedro, as crianças não possam continuar frequentando as aulas no Érico Veríssimo.
No mesmo local, outras 230 famílias que convivem em um terreno da Prefeitura podem ter de deixar suas casas nos próximos três meses. A Prefeitura, que garante não ter recursos para oferecer aluguel social ou casas populares, conseguiu uma liminar que dá prazo de 90 dias para que os moradores providenciem suas mudanças.
Fonte: Amanda Fernandes / O Alvoradense