“O Lobo e o Leão

Um dia, um lobo roubou um cordeiro. Estava levando-o ao covil, quando veio um leão e roubou sua presa. O lobo tomou certa distância e gritou:
– Bandido, roubaste o que era meu!
O leão pôs-se a rir:
– E por acaso tinha sido presente de algum amigo teu?
Assim se acusam mutuamente bandidos e ladrões insaciáveis quando surpreendidos pelas adversidades. (Esopo)”.

O que dizer sobre a tese de “doutrinação” nas escolas? Esta tem sido uma pergunta que, pelo menos uma ou duas vezes na semana alguém me faz. Não sei exatamente os motivos, mas tenho sido relutante em escrever sobre o tema. De qualquer maneira, ao longo das colunas semanais, já dei pelo menos uma pista: sempre rejeitei a tese da neutralidade. Isso significa que, diante de qualquer situação, estabelecemos prioridades e agimos a partir de um ponto de vista. Em sala de aula não pode ser diferente. É no contexto dos episódios de tentativas de proselitismo político-partidário nas escolas que pais e estudantes criaram uma organização para combater aqueles professores e ações que, em nome de “visão crítica de sociedade”, acabam por impor um ponto de vista unilateral, sufocando a liberdade de expressão: trata-se do Escola Sem Partido.

É verdade que as relações entre professores e estudantes são assimétricas. Isto é, que o professor possui o “poder da caneta”. Pode dar ou não dar aqueles três pontinhos, a título de participação em sala de aula. Da mesma forma, um professor “de esquerda” ou “de direita” pode ser mais rigoroso com os alunos “de direita” ou “de esquerda”, avaliando-os de forma mais rigorosa. E isso é muito mais comum do que se imagina. Nem o livro didático que, de alguns anos para cá, vem ameaçando melhoras expressivas, escapa das acusações de doutrinação.

O fato é que, eventualmente, há exageros daqui e dali, e a porta da entrada da doutrinação acontece através da afetividade. Minha pouca experiência sugere que eles acontecem onde a atuação pedagógica do grupo é frágil ou inexistente. Entenda-se por atuação pedagógica as necessárias reuniões com e entre professores, a atuação de equipes diretivas, a existência de orientação e supervisão escolar, e a efetiva participação de pais. Essa fragilidade acaba acontecendo por causa de um certo entendimento de liberdade: professor entra na sala de aula e dá a aula que quer, confundindo liberdade com licenciosidade.

Além disso, e considerando que professores ainda tem o “poder da caneta”, em algum momento o professor já foi a autoridade máxima em sala de aula. Isso acontecia por conta da estrutura escolar autoritária (que ainda permanece) e, principalmente, porque um dia foi o detentor do saber. Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e do Estatuto da Criança e do Adolescente, hoje até a criança de seis anos tem o direito de questionar a metodologia empregadas nas escolas; da mesma forma, por vezes os alunos contestam os critérios dos professores. E que bom… o resultado desse processo é que alunos avaliam e comparam, a todo momento, os professores. Sabem muito bem quem são os que tem domínio dos conteúdos, os que dialogam, e também sabem identificar quem são os picaretas. Por conta do desenvolvimento tecnológico, o espaço para o professor “fazer a cabeça” do aluno é cada vez menor. A doutrinação mais feroz e perversa acontece nas igrejas, através da mídia e das redes sociais.

Afinal de contas, qual deve ser o espaço da política, seja política partidária ou não, nas escolas? Se o monopólio da política é dos partidos políticos, estamos lascados. E o motivo é simples: partidos políticos são, por definição, organizações oligárquicas. O objetivo delas é manter-se no poder. Basta observar a política partidária em Alvorada, com pouca ou quase nenhuma renovação em seus quadros, o que força o eleitor a votar no que considerar menos ruim, em vez de votar na melhor alternativa.

Este texto começou com uma fábula de Esopo, escritor dos tempos da Grécia Antiga. O objetivo dela é o de mostrar que suas fábulas estão bastante longe da pretensão de neutralidade; ao falar de animais e/ou elementos da natureza, as fábulas sempre terminam com a “moral da história”. Do ponto de vista de seu conteúdo, cabe lembrar que o Legislativo tem exercido cada vez maior intrusão em relação ao magistério. Em vez de propiciar as efetivas necessidades das escolas e mais momentos de debates e de formação contínua, opta por determinar como professores devem ou não se comportar. Na minha opinião isso acontece por conta do insulamento burocrático, o que leva governantes e legisladores a se acharem os melhores do Universo. Estamos em ano eleitoral, e diante disso faço apenas uma recomendação: muito cuidado com lobos que, muito em breve, vestirão pele de cordeiro…

Em tempo (1): quando os Portais da Transparência das cidades com mais de cinquenta mil habitantes do Rio Grande do Sul foram analisados, em 18 de junho de 2013, o de Alvorada apresentou o pior escore do estado; segundo os estudiosos, “o município disponibiliza poucos dados, e ainda de forma inadequada, não há um sistema integrado. O Portal de Transparência apresenta somente relatórios de gestão fiscal em arquivos com formatos pdf. A receita prevista está somente no balanço MUNÍCÍPIO AVALIAÇÃO GLOBAL Alvorada -33 Parobé -8 Cruz Alta -4 orçamentário da Secretaria Municipal da Educação, enfim não há o cumprimento legal do princípio da transparência”.

Está aqui o motivo da política de sonegação de dados, nas reuniões do Confundeb de 2013, o que nos levou a rejeitar, em um primeiro momento, as contas da educação na cidade. Já o Ministério Público Federal apresenta outro cenário, em que a cidade saltou da nota 6,1 (em 2015) para 9,1 (em 2016). É verdade que o Portal melhorou consideravelmente, mas o cheiro de manipulação é forte… parece deboche: transparência total depois que a Prefeitura praticamente entrou em falência para os servidores? Agradeço ao Maurício Cardoso, por me colocar em contato com esse estudo de 2015.

Em tempo (2): meus amigos historiadores Fábio Melo e Rafael Freitas idealizam em Alvorada, no ano de 2013, a criação do Grupo de Estudos Americanistas Cipriano Barata, e publicam o Manifesto Americanista. Com o tempo, a turma foi crescendo, e o Felipe Carreira, o Luis Marcelo Santos e eu entramos para o grupo. Hoje o grupo possui um site, uma comunidade no facebook e também programa com entrevistas, o História em Pauta. Além disso, o pessoal marca, de tempos em tempos, os encontros chamados “Síncrese Americanista”, para reunir debatedores: a quarta edição desses encontros acontecerá no sábado próximo, dia 18 de junho, a partir das 14 horas no Ponto de Cultura La Integracion (rua Santana, 206, em Porto Alegre). É uma pena que meus deveres de pai tem impedido minha participação… mesmo assim, estou em dívida com os amigos, e espero que em breve possamos resolver isso.


Em tempo (3): embalado pela experiência bem-sucedida do Orçamento Participativo em Porto Alegre, também já fui simpatizante do petismo. Lembro que em 2004, ano em que cheguei na rede municipal, costumava debater a educação em reuniões na casa do professor Serginho. Numa dessas reuniões e em tempos de eleições, uma ameaça bastante repetida na época era a de que a roubalheira seria tanta que os salários dos servidores públicos municipais atrasariam. Isso não aconteceu. Pelo contrário: muitas vezes o prefeito mandava antecipar o pagamento dos salários. A outra ameaça era a de que “a direita” retiraria a trimestralidade, uma conquista dos servidores. Ironicamente, quem está retirando a trimestralidade é o atual governo “de esquerda”, com a conivência da vereança. E vai mais longe ainda, achegando ao ponto de entrar com ação de inconstitucionalidade da lei municipal. Resta saber se a Câmara de Vereadores entrará com recurso ou deixará o Executivo municipal agir, mais uma vez, à vontade. Diante desse cenário, o Sima já agendou assembleia para o fim da tarde de 6 de julho, a partir das 17 horas.