Para a Preta Clarice, sempre.
“Devo eu dividir o amor em partes
ou dividir-me nele”
(Carlos Nejar)
Esta paz de água quando mergulho
em teu âmago
eternas paisagens
de verdes, luas, terra roxa, chuvas e
estações
é a força sagrada
que só teu corpo acredita
unindo-se a cheiros, climas,
presságios
gerados em teus pensamentos
Quando nos tocamos
a vertiginosa descoberta
o fundo mar de tua alma
clama coisas fortes
(inundações)
invadem teu ser
e nenhum valor é
nem tradução verbal
a definição exata
da beleza
no instante que acontece
o percurso em teu corpo
que desfaz as rotas
de todas embarcações.
Alma,
sou escravo de tua ânsia
punges nos confins do sangue e esperma
carrego-te
quando anoitece
para a viagem
ao outro lado do eu
sem memória
tempo, espaço
apenas a matéria
que molda a
paixão
no coração dos homens
Quando nos tocamos
o silêncio líquido e vegetal
explode
morno e brando
dentro do corpo e além
o amor irá seguindo
o sol que és
mergulha profundo
morro e amanheces.
O amor é pura metáfora
onde o corpo exercita seu desejo
A fronteira
são estrelas, frutos crescendo
movimentos lentos
de folhas
O corpo é morada
reduto
ciência, extensão de músculos
vertigem d’água e silêncio
No universo e aquém
corpo, corpo
plantaste a árvore
qual a semente?
O labirinto onde descobrimos
os esconderijos
dos fantasmas
a brincar de torturas
nas paredes gastas
da memória
é o canto desesperado e ácido
do pássaro
(um deus alado)
que despe sua nudez de asas
para que assim siga o mundo
Mítico e bruto
carregamos os fardos
nenhum vestígio de dor
persegue os sonhos
apenas o largo e afetuoso
abraço da paixão
nos toma nos braços e adormecemos
toda busca é pouca
para tanto achado
Herdamos os vícios
e prosseguimos
que o mergulho será
mais vário e fundo não há
para encontrarmos
em precárias e provisórias
buscas
todo sangue
ainda quente
de nossos mortos.
Mundo,
sem esconderijos possíveis
te espreito e aguardo
com o amor que recebi de herança
e se não vinga ao chão
onde foi plantado
germina sua semente
no centro do músculo vivo
ó coração, é preciso urgente
recuperá-lo
tocá-lo com todo o gesto que alimente
de delicadeza
consciente por saber
que não estamos
transitamos entre os vivos
Expostos ao sol dos séculos
a matéria transcende ao movimento
histórico
dos pensamentos
(qual dos dois precedeu a criação)
Apesar dos intervalos brancos
da crença perda saudade e fé
o sol nascerá sempre
Ó origem e continuação
de todas as coisas
só o amor nos transmuta
e liberta.