“ Compreender um poema quer dizer, em primeiro lugar, ouvi-lo. Ler um poema é ouvi-lo com os olhos; é vê-lo com os ouvidos. O poema deve provocar o leitor: obrigar o leitor a ouvir – a ouvir-se.”

Octavio Paz

O poema perfeito
Para Dillan Rubim

Sem nenhum estilo
No primeiro verso
Já quebre a expectativa.

Use e abuse de palavras significativas
Escolha as mais belas
Rompa com a tradição
Mas só depois de ler os clássicos:
Homero, Catulo, Horácio, Anacreonte,
Virgílio, Camões e Dante.

Deixe sempre um verso implícito
Com sutileza e abusada ironia
Seja realista em situações absurdas
Nunca confunda, nem confirme ou afirme
Nada pior que a superficialidade.

Mergulhe na alma humana
Na profundeza erma do ser
Explore suas considerações filosóficas
Porém, fique atento as divagações metafísicas
Às vezes são intrincados labirintos, outras, prisões.

Ouse, invente, reinvente
O insondável, o indizível abstrato indescritível
Mas lembre-se: a surpresa está na simplicidade
A descrição da mensagem
Se decifra nas entrelinhas.

Não exorbite da metáfora
Escolha com inteligência
Assim como a prosopopeia
a etimologia e a símile.

Corte as palavras excessivas
Seja lâmina concisa, sem floreios
Reescreva, refaça, amplie, transpire
Escrever é, acima de tudo, reescrever.
Não esqueça os paradoxos, ajudam
o leitor a pensar o impensável
Cultive uma leve simpatia pelo
Anti-herói, o anticlímax e guarde
para o granfinale as dualidades,
as antíteses, os contrastes.

Se seguiste à risca esses passos
E mesmo assim o poema
Não revelou-se perfeito, insista.
Nada de desânimo, nem desespero.

Poema extraordinário não tem guia
manual, receita ou coisa que o valha
Só pensei em voz alta possibilidades
Antes de reiniciar pela milésima vez
meu poema mais que perfeito.

José Couto

Vídeo poema interpretação do Poeta Antonio Torres

*

INCONCLUSO

Enquanto deuses alimentam-se da solidão humana
No longínguo deserto de Mojava
um mantra imperceptível
Ecoa permanentemente
Mas ninguém entende seu significado

Não sabemos mais
Se é emoção que persiste
Ou nos movemos a procura do inesperado

Ardentes são os desejos e as incertezas
Mesmo dispersos
Sóis nascem e se extinguem
a todo momento.

José Couto

*

Vídeo poema interpretação Chris Herrmann