Depois de um semestre de bastante trabalho, numa bela noite resolvo dar uma saidinha para comer umas batatas-fritas, tomar um refri esperto e, quem sabe, encontrar alguns amigos para jogar conversa fora. Não tarda muito, aparecem dois protagonistas políticos, de partidos diferentes, e que me fizeram afirmações estarrecedoras: a primeira delas é a de que os partidos políticos não tem muito interesse em debater educação. Será mesmo? Desconfio que ele tem razão, infelizmente.
Já o segundo, em meio a um debate, afirma que a recente Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) pelo senhor prefeito serviu para deixar prejudicados pelo menos duas diretoras de escola, ambas ligadas a vereadores da base governista. Pensando nisso, no dia seguinte percorro o site do Alvoradense e me dou de cara com excelente texto do Irio Almeida. Conheci o professor Irio em 2010, quando recém tinha assumido a direção no Elisardo e fui convidado a ser um dos debatedores do I Fórum da Diversidade, nos tempos em que a professora Maria de Lourdes fazia as coisas acontecerem na rede, através do Espaço da Diversidade. Escolhi um tema que não tinha domínio, o que me forçou a estudar um pouco: quilombos urbanos. Na mesma mesa, Irio foi Secretário. Voltando ao texto do Irio, o texto dessa semana pode ser visto como prosseguimento das ideias dele. Ou, então, como um exercício de memória e observação sob outra perspectiva, já que nossas trajetórias são diferentes. Afinal de contas, tendo a concordar com ele, mas apenas em parte. Lembro que, alguns meses antes de assumir o Elisardo, minha ex-diretora disse que era importante ter “o seu vereador”. Será que isso é importante mesmo? Parece que está é uma espécie de “cultura”, há tempos naturalizada na rede municipal. Afinal de contas, o que pode ser dito a respeito das escolas colocarem, em seus espaços, vereadores e candidatos?
O Irio defende que há um abismo quando o que deveria ser um Conselho Escolar, entre o que a legislação municipal prevê e o que efetivamente acontece. É um fato. Também argumenta que as direções de escola aceitam que o Conselho Escolar, órgão máximo nas escolas, seja atuante, mas desde que não se constituam ameaças às direções, sendo que a maioria das direções quer controle absoluto das decisões. Este cenário gera, segundo ele, uma pseudo-democracia. O governo, para que as ações nas escolas resultem em democracia, poderia participar das reuniões nas escolas, capacitar os Conselheiros, ofertar capacitação às equipes diretivas, fomentar organizações escolares como Grêmios Estudantis e Círculos de Pais e Mestres e, por fim, um escorregão: criar mecanismos de acompanhamento dos Conselhos Escolares. O problema dessa última proposta é: quem controlará os controladores? É um problema sem solução. De qualquer forma, a esta lista eu incluiria uma simples alteração na lei que regulamenta os Conselhos Escolares, de modo a impedir que integrantes da equipe diretiva façam parte do mesmo, à exceção do diretor ou diretora, pois de acordo com a lei é membro nato.
Mas é possível que qualquer gestão escolar seja efetivamente democrática quando as pessoas que compõem as direções escolares são, ao mesmo tempo, militantes “dos vereadores”? Pode uma gestão escolar ser democrática quando os partidos se reúnem para ocuparem as escolas com “suas” equipes diretivas, tal como aconteceu em 2013? E podem ser democráticas quando vereadores patrocinam as campanhas dessas equipes, o que implica em relação de dívida, contrariando os interesses diretos de professores e comunidades escolares? Uma coisa é estar articulado com o governo e a Smed, com o objetivo de buscar parcerias e recursos para as escolas; outra coisa é estar atrelado a vereador cuja produtividade legislativa nas sessões ordinárias, somente em 2015, foi ZERO. Neste segundo caso, há uma conta a ser paga. Isso significa que, mesmo que um determinado Conselho Escolar tenha autonomia e que as equipes diretivas promovam a abertura necessária, o resultado é exatamente o mesmo: a pseudo-democracia.
Resta uma última questão: é possível que um governo municipal cuja cúpula decide impor, goela abaixo, mudanças na lei de gestão democrática, compra a vereança para que a aprove na calada da noite, sem o mínimo de debate (para calar todas as vozes oponentes), patrolando toda e qualquer emenda ou proposta efetivada e isso magicamente resulte em democracia? Na minha opinião é impossível. Uma democracia exige a construção de uma cultura política adequada, e o problema vai bastante além dos Conselhos Escolares, embora eles realmente sejam fundamentais. Deu tudo errado, Irio, e não foi por falta de aviso. Aliás, parece piada da semana: o governo do assédio moral (vide greve de 2014) reuniu seus melhores especialistas para a feitura de uma cartilha. É para inglês ver…
Em tempo (1): alguns meses atrás a prefeitura propagandeou que o Portal da Transparência melhorou bastante. Por isso, resolvi fazer o test-drive. Achei algumas pérolas que dão a medida do escândalo. Por exemplo, como pode uma professora ter duas matrículas no município, atuar na SMED e, em cada uma de suas duas matrículas, receber regime suplementar (mecanismo conhecido por “convocação”) e função gratificada? Há professores recebendo por sessenta horas… impressionante.
Em tempo (2): quando observamos os números da Câmara de Vereadores, o escândalo talvez seja maior ainda. Apenas em passagens junto a empresa de turismo foram R$ 42.043,44, entre janeiro até 14 de julho. São muitas as viagens de nossos nobres no país, de Aracaju ao Rio de Janeiro. E agora, para deixar o queixo cair, que tal uma observada nos valores gastos em diárias? Sente-se. Para não dizerem que estou mentindo, a imagem está abaixo:
Em tempo (3): estive, por convocação da Smed, nos relatos de experiências, e assisti aos relatos de quatro colegas de geografia, em 20 de julho. Mediados pela professora Iva Barbizan, eles foram muito bem apresentados pelos quatro colegas. Extremamente realizadores, há excelentes práticas não divulgadas entre colegas; por isso, parece que não existem – infelizmente divulgamos muito pouco sobre o que fazemos. Uma baita sacada foi conhecer o projeto “caixas do conhecimento”: cada aluno tem a sua caixa, e nela coloca alguma pergunta, notícia ou algum comentário para ampliar conhecimentos, sendo que todos eles são lidos em sala de aula. Idealizado pela professora Maria Enaura Tavares, na E.M.E.F. Duque de Caxias, ele foi encaminhado para o concurso Professor Nota 10, por iniciativa de sua diretora, a professora Helenita. A primeira etapa de seleção já aconteceu e, para nossa alegria, está selecionado entre os cinquenta melhores. Ficamos na torcida. Que a Enaura é dez, não tenho a menor dúvida.
Em tempo (4): Luciana Tubello Caldas defenderá, sexta próxima, dissertação de mestrado. Seu objeto de estudo é o Clube das 5, projeto do professor Andre Bozetti, acolhido pelo atual governo municipal. É muito bom ver, de alguma forma, o projeto e a cidade serem projetadas positivamente.
Embora não seja fã da perspectiva teórica pós-moderna (na minha opinião isso está acabando com as ciências sociais e com a pesquisa aplicada em educação), a Luciana deu acesso ao resumo de sua pesquisa, e está de parabéns. Veja abaixo:
“RESUMO
Esta pesquisa trata das relações entre cinema e educação. Tem como foco o trabalho de formação de crianças e adolescentes, integrantes do Projeto de Produção Audiovisual Clube das 5 – projeto de oficinas de cinema realizado na rede pública de ensino do município de Alvorada, na Região Metropolitana de Porto Alegre/RS. O objetivo é discutir a potência educativa e formativa do cinema, mediada pela figura do mestre; no caso, estudamos as estratégias do professor André Bozzetti que, no ano de 2013, idealizou o projeto, fazendo um convite aos seus estudantes, do 4º ao 8º ano escolar, da Escola Municipal Emília de Oliveira. Metodologicamente, nos inspiramos no fazer etnográfico, para levantar, compor e apresentar os dados da pesquisa; basicamente, operamos com a escrita de relatos de campo. Como referencial teórico, centramos a discussão nos conceitos de formação, psicagogia e parresía, como apontados por Foucault, em A Hermenêutica do Sujeito. Buscamos empreender uma descrição das escolhas de um mestre que coloca o cinema em discurso, tendo como objetivo não apenas a transmissão de um certo saber, mas modos possíveis de transformação de sujeitos jovens. Dito de outro modo, tratamos da figura do mestre que se forja no âmbito da psicagogia. Por fim, lançamos a hipótese de que o “Clube das 5” figura como um espaço de produção de verdades impulsionadoras de condutas éticas e estéticas – no sentido foucaultiano. Uma dessas condutas diz respeito à ideia de um processo compartilhado – entre professor e aluno – de formação e produção de conhecimento. Tensiona-se, assim, as proposições de um tipo clássico de formação, que supõe o sujeito como carência ou “não saber”. Os dados registrados e analisados evidenciam escolhas que escapam daquela educação que ignora repertórios e desejos tão diversos, apostando, ao contrário, na potência de práticas de formação de si, pela arte do cinema e da criação.
Palavras-chave: formação de si, cinema, educação”.
Em tempo (5): por falar em Clube das 5, e já que recordar é viver, cabe lembrar que a cidade poderia estar usufruindo de uma escola de cinema, com produção de curtas-metragens. Porém, a “prefeitura da mudança” fez a proeza de perder 392 mil reais, e que estiveram destinados ao projeto. Simplesmente absurdo.