“Quem já conheceu o estado de graça reconhecerá o que vou dizer. Não me refiro à inspiração, que é uma graça especial que tantas vezes acontece aos que lidam com arte. O estado de graça de que falo não é usado para nada. É como se viesse apenas para que se soubesse que realmente se existe. Nesse estado, além da tranquila felicidade que se irradia de pessoas e coisas, há uma lucidez que só chamo de leve porque na graça tudo é tão, tão leve. E uma lucidez de quem não adivinha mais: sem esforço, sabe. Apenas isto: sabe. Não perguntem o quê, porque só posso responder do mesmo modo infantil: sem esforço, sabe-se. ”

Clarice Lispector

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“Há um sopro de vida em Cantata dos Ventos, que nos leva à magia de viver. Pelo som das palavras, os estilos mudam de acordo com a dinâmica do vento que os traz: modernista, sonetos, haicais… Gustavo Terra leva o leitor ao voo outonal pelas asas do pássaro poético e na viagem surreal de imagens colhidas pelo pincel-caneta em uma paleta de palavras. O poeta projeta-se na imagem polida das palavras em atmosfera visceral do tempo. Gustavo é alquimista, faz do silêncio sua semente-embrionária para compor ramalhetes poéticos, transpõe o horizonte chega ao cais da memória eterna onde o mundo passa… ali senta-se e ‘aproveita o instante’, fisga o momento e eterniza-o em poesia.”

Rita Elisa Seda

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Aos poetas

Ler o que escreveram esses sonhadores insones
desde a suave manhã
até a noite derradeira
o que se inscreveu nas rugas do tempo
nas rusgas da mente
desses lúcidos recriadores do senso
moduladores do verbo
jardineiros do verso

é ler a vida com vistas de achar
aqui, ali, outro lá
a vida que é divisa
da terra seca
e do numinoso mar…

escrevemos por ordem da Luz
tecendo uma luz de outra ordem
de sons que nos pintam outros
que somos
em carne de fogo
sem osso
só sopro

Gustavo Terra

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Ah, mulher…
que nascemos num dia de festa
de um paraíso qualquer
e viemos valsar
no infinito
a canção que aprendeste
lembra-me quem sou…
larga teu véu e canta
e teçamos a esperada manhã

o mar espera ser navegado
e o céu nos incita
ao milagre do corpo
este espelho
de refletir estrelas…

Gustavo Terra

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Palavras bonitas
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Quis de mim palavras bonitas, sem valor
outro que não fosse a intrínseca delícia
em dizê-las, lúbrico delírio da língua
voo raso e repouso de um beija-flor

deu-me o vermelho casto no riso que aflora
no sutil da aquarela alameda de hibiscos
soprou verdes aromas de alecrim e citrus
por veredas de luz violácea da aurora

devolvi arquipélago estrela acalanto
romã, balalaica, alfazema, luar…
e toda beleza que me soprava o mar
sorriu… lábios… beijo… céu… silêncio… encanto…

Gustavo Terra

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Nascido em Jacareí, SP em 1972, mora em São José dos Campos desde 1992. Publicou poemas e haicais em periódicos de literatura dessa cidade durante a década de 90. Em novembro de 2015  lançou o livro Cantata dos Ventos, uma antologia de poemas escritos nos últimos 22 anos. Desde 2002, trabalha como Agente Cultural na Fundação Cultural Cassiano Ricardo.

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O livro pode ser adquirido no site da Editora Multifoco. Ou com o autor, neste link.